quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Profissionais de nível técnico podem ganhar mais que os de nível superior

Edney Silvestre - G1 Globo.com - 04/09/2012 - Rio de Janeiro, RJ

Os cursos técnicos podem ser uma ótima opção para quem ainda não escolheu que carreira seguir ou quer mudar de área. Uma pesquisa mostra que os salários em alguns setores da indústria são maiores do que os de profissionais com nível superior.
Vinicius Ferreira da Cruz é técnico em soldagem. Em uma multinacional, ele controla a qualidade da solda de tanques para fabricação de gases de acordo com as normas dos diversos países do mundo para onde a empresa exporta. Aos 27 anos, Vinicius já pode pensar em se casar, como queria há um bom tempo. Ele ganha hoje três vezes mais do que quando era caldeireiro, seis anos atrás. O salário de Vinicius não é exceção.
Um estudo do Senai mostrou que trabalhadores de muitas áreas técnicas ganham mais do que profissionais com diploma universitário, como médicos, advogados, analistas de sistemas e desenhistas industriais. Segundo o levantamento do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, a remuneração média de começo de carreira para trabalhadores de 21 ocupações técnicas é de R$ 2.085,57.
Em Pernambuco, chega a R$ 2.545. É superior ao recebido de médicos recém-formados. Em Goiás, ultrapassa o de novos advogados: R$ 2.465. Em São Paulo, chega a R$ 2.838, superior ao de desenhistas industriais e analistas de sistemas. O que mudou a vida de Vinicius foi um curso técnico.
“Foi quando aqueceu a indústria naval e eu percebi que a área de soldagem era muito carente. Eu optei por fazer o curso técnico de soldagem devido à carência da área”, explica o técnico em soldagem.
Com a mesma esperança, jovens estudam 20 horas por semana em um curso técnico. Será assim por dois anos e meio.
“Meu foco inicial é terminar o meu curso técnico, arrumar um emprego na área, e posteriormente dentro da indústria, quando eu já tiver lá dentro, direcionar para outra área, alguma coisa que seja dentro do que a indústria pede”, conta Fabio Merathi de Medeiros, técnico de informática.
Pelo futuro como técnico, Diego vai deixar de lado uma carreira militar.
“O Brasil hoje em dia necessita muito dessa mão de obra. Muitas grandes empresas estão procurando e tentando resgatar o máximo desses alunos pra poder incluir no mercado de trabalho”, diz Diego da Silva Sales, militar.
Eles sairão daqui técnicos em automação industrial com salário inicial em torno de R$ 2.400. Ainda são raridade. “A nossa estrutura é fortemente voltada para a educação regular e não para a educação profissional. Na Alemanha, dos jovens entre 15 e 19 anos, 53% tem educação profissional. No Brasil, esse número é apenas de 6,6%”, diz o diretor-geral Senai, Rafael Lucchesi.
Muito requisitados, profissionais como Vinicius podem alcançar aumentos de até 160% do salário inicial. No momento, existem no Brasil dois milhões e 400 mil trabalhadores com nível técnico. E quem tem 10 anos de experiência está ganhando, em média, R$ 5.690. Ou seja, mais de nove salários mínimos.
“O fundamental é levar essa informação para a juventude. Que ela pode, sim, apostar na educação profissional na sua visão de carreira futura”, aponta o diretor-geral Senai.

Pra que serve isso tudo?

Coluna Livre - Portal Aprendiz - 03/09/2012 - São Paulo, SP

Há anos se escuta que o papel da escola na chamada “era da informação” não é mais informar o aluno, mas formá-lo. Seria ocioso empanturrar o educando de conhecimentos, muitos dos quais ele já obtém por outros meios, em especial a internet; o que interessa acima de tudo é lhe dar a capacidade de filtrar os conteúdos para o resto da vida, ficando com o que tem valor.
Não cabe aqui entrar na complicada questão da confiabilidade das informações a que os estudantes têm fácil acesso hoje, embora o tema exija reflexão cuidadosa e urgente nos meios pedagógicos. Cabe, porém, o alerta de que, se a capacidade de selecionar criteriosamente informações evita, por um lado, que o aluno fique atordoado em meio a uma variedade de fontes de conteúdo, não impede, por outro, que termine por se perder num emaranhado de elementos desconexos dentro da própria cabeça. É a velha questão que o estudante, em alguma fase do seu amadurecimento, acabará por colocar: “Mas pra que serve isso tudo”? Ele seleciona os dados que importam, mas os pedaços soltos não se encaixam naturalmente, não se harmonizam, não convergem para nada.
O colégio raramente vai dar uma resposta para essa indagação ou ajudar o aluno a encontrá-la. Pelo contrário: vai provavelmente dificultar a montagem do quebra-cabeça mental, com uma profusão de ensinamentos fragmentados e muitas vezes contraditórios. Em português, por exemplo, é grande a chance de a criança ser acostumada à ideia de que, como a língua é um processo ininterrupto de transformação, não existe erro em matéria de idioma, e sim padrões distintos de expressão, todos igualmente aceitáveis. Já na matemática e nas demais disciplinas que envolvem cálculo, sai a relativização do certo e do errado e entra um cortejo de fórmulas estanques consagradas pela autoridade da ciência. As correntes elétricas, ao contrário da regência dos verbos, não admitem interpretações subjetivas.
É natural, claro, conviver com uma certa confusão de informações. O adulto também não consegue encaixar perfeitamente todas as peças do quebra-cabeça que o irá acompanhar até o fim da vida. Nem o professor consegue. O adolescente, aliás, é naturalmente obrigado a passar por uma imersão no caos para poder começar a assumir a responsabilidade pela própria vida. Alguma ordem, porém, precisa existir. Se a escola não der ao aluno a capacidade de integrar as informações desconexas numa visão abrangente, com um mínimo de coerência e harmonia ? e ela normalmente não dá ?, ele vai buscar por conta própria, onde puder, a integração dos conhecimentos. Provavelmente vai tomar emprestado do meio social em que vive algum arremedo de visão de mundo, que será mais confusa quanto mais desordenado for esse meio social.
Às universidades, como a própria palavra já indica, caberia, tal qual já coube em outros tempos, dar ao estudante uma compreensão universal da gama de informações que ele acumulou ao longo dos anos. Mas, de modo geral, elas abdicaram dessa responsabilidade há décadas, transformando-se em meras escolas profissionalizantes que mal preparam os alunos para as exigências do mercado de trabalho. E não dão o menor sinal de que vão mudar.
A conclusão inevitável é que é preciso, antes de o aluno deixar o ensino médio, ajudá-lo a filtrar informações e integrá-las numa concepção de mundo mais ou menos coerente. Não se trata de doutrinação. Trata-se de lhe dar condições de juntar as peças, de procurar conscientemente sua própria concepção de mundo, o que faz parte do desenvolvimento de uma inteligência autônoma. Formar o educando além de informar, um mantra dos estabelecimentos de ensino, não se consegue sem a indispensável integração dos saberes, fundamento da boa educação.