segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Por trás dos números da educação


Jacques Schwartzman - Professor Adjunto da UFMG, aposentado
Estado de Minas, 27/02/2012 - Belo Horizonte MG

No começo do ano letivo das escolas e faculdades é comum encontrar na imprensa matérias sobre elevação de alguns preços que afetam estudantes e instituições de ensino. Trata-se do reajuste das mensalidades e da longa e histórica luta dos estudantes pelo passe livre nos transportes coletivos. Quanto às mensalidades é preciso fazer alguns esclarecimentos. Inicialmente deve-se constatar que não trabalhamos com um índice que reflita fielmente e especificamente os custos educacionais. Geralmente utiliza-se o IPCA do IBGE ou o IGP-M da Fundação Getulio Vargas (FGV), que dificilmente podem servir de substitutos de um índice próprio do setor. Basta lembrar o elevado peso dos preços por atacado no índice da FGV. O reajuste das mensalidades também deveria ser constante em termos reais. Isto é, o aluno não pode ser surpreendido por um aumento real de mensalidades acima do valor contratado quando decidiu por determinada instituição, em que o valor da mensalidade certamente foi um elemento importante na sua tomada de decisão. No entanto, a cada ano, para os novos alunos, pode-se estipular outro valor que reflita um simples desejo de faturar mais e até o de cobrir custos adicionais, que antes não estavam previstos. Esse aumento é livre, mas deve estar baseado no mercado que determinará seu ponto d equilíbrio.
Outra importante consideração é a de que os aumentos de mensalidades podem estar relacionados a uma tentativa de melhorar a qualidade do ensino, seja por meio de novos equipamentos, seja por aumentos salariais para garantir a permanência de bons docentes e bons funcionários. Nesse caso, as reinvidicações por menores mensalidades podem resultar em piores condições de ensino. Da mesma forma, é incompatível querer ao mesmo tempo redução de mensalidades e uma pós graduação strictu sensu de boa qualidade. Na maioria das universidades privadas, que têm cursos de mestrado e doutorado, somente parte dos custos são cobertos por mensalidade. O maior deles, de longe, é o custo do professor doutor em tempo integral, sem o qual não pode haver pós-graduação e que raramente é coberto por órgãos como CAPES e CNPq. Por isso, a discussão sobre mensalidades restringe-se à graduação. É certo o prejuízo com a pós-graduação no setor privado, razão pela qual é pequeno o seu papel no contexto brasileiro. Por outro lado, não cabe aos alunos de graduação se preocupar com o destino da pós, que, na maioria dos casos, está fora dos planos desses alunos. Deve-se reconhecer também que nem todas as instituições privadas distribuem seus eventuais lucros aos acionistas. Nesse caso, estão as fundações sem finalidade de lucro, que quando os tem são internalizados na própria instituição. É fato que temos um número decrescente de instituições desse tipo, mas é preciso reconhecê-las quando surgem.
Quanto ao passe livre para os estudantes em transporte coletivo, o assunto está mais relacionado aos estudantes do nível básico, pouco se vendo estudantes de nível superior nessas manifestações. Nesse caso, preocupa-nos a questão distributiva. Como se sabe o ensino fundamental (até a nona serie) é obrigatório em nosso país e como tal accessível a qualquer cidadão. Na prática, os mais ricos vão para o ensino privado e os mais pobres para o setor público. Seria razoavelmente justo limitar esse benefício a alunos do fundamental do ensino público. Mas quem pagaria a conta? Em princípio, esse custo seria transferido para o preço da passagem e pago por todos. Como é generalizada a distribuição de vale-transporte para os trabalhadores, o resultado seria mais um pouco de inflação para aquelas empresas que não conseguirem evitar a transferência de seus custos. Mas passagens de coletivos são apenas um dos itens que afetam o custo da educação. Temos também o livro didático, merenda escolar, o uniforme e outros materiais de ensino. É preciso também melhorar a questão da carreira dos professores de ensino básico, que é o item mais caro dessa lista. A gratuidade do ensino, juntamente com a sua obrigatoriedade, para ser efetiva para alunos de baixa renda, deve cobrir todos esses custos, e a passagem grátis nos coletivos é apenas um deles.

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